Esta é uma peça da série “Dançando contra a maré”, que foi descobrir onde estão agora os alunos da Escola Artística de Dança do Conservatório Nacional, do ano letivo 2020/2021.
Desde os quatro anos de idade que Inês Gomes mergulha num mundo onde cada movimento é uma expressão artística e cada passo é uma história contada sem palavras. Começou o seu caminho enquanto bailarina numa escola de dança da sua cidade em Coimbra onde permaneceu até aos 10 anos, e que, por ironia do destino, é uma das escolas na qual atualmente dá aulas. “O que é um privilégio”, afirma.
Inês confessa que desde sempre “ser bailarina era a primeira opção não havia outra primeira opção”. Porém, também chegou a pensar em ingressar por medicina desportiva ou na área do teatro: “Eu acho que sinceramente todos os anos era uma coisa diferente, mas nunca saía muito ali da parte física ou funcional da coisa”.
Inês ingressou no Conservatório com 10 anos. Este não aperfeiçoou apenas as suas habilidades técnicas, mas também moldou a sua resiliência e determinação. A disciplina exigida pela dança moldou não só o corpo, mas também a mente, preparando-a para os desafios que viriam depois. “A pressão era gigante e às vezes não era a de nós estarmos a comer e eles nos apontarem o dedo”, revela Inês. “Era mais o físico, porque havia pessoas que não comiam mal, mas o físico não era propriamente o aceitável”.
“Foi muito difícil a nível psicológico, a nível físico foi muito complicado, mas preparou-nos para aquilo que é a vida”
A jornada de Inês não foi uma dança suave sem obstáculos. Após sair do Conservatório e entrar numa companhia de dança em Famalicão, ela confrontou as realidades muitas vezes cruas do mundo artístico, questionando várias vezes o seu futuro na profissão: “O ano que estive em Famalicão foi muito crucial para aquilo que era o meu gosto pela dança. Eu nunca não gostei e aquele ano fez-me quase não gostar”. Esta experiência foi um ponto de viragem, levando-a a repensar acerca dos seus objetivos e explorar novas paixões, incluindo o jornalismo.
Hoje, com 21 anos, Inês está imersa em duas jornadas paralelas: uma como estudante de Estudos Europeus com Minor em Jornalismo na Faculdade de Letras de Coimbra e outra como professora de dança em três escolas da região. Apesar de todas as dificuldades enfrentadas durante os seis anos que estudou no Conservatório de Lisboa, Inês garante que nunca se arrependeu: “Foi muito difícil a nível psicológico, a nível físico foi muito complicado, mas preparou-nos para aquilo que é a vida”. A jovem relata que para além dos elevados custos financeiros “O meu pai dizia sempre que tinha que fazer um tubo direto do ordenado dele para o ballet shop, porque aquilo era ridículo…valores ridículos”, as consequências a nível emocional eram piores: “Era muito complicado, numa turma de quinze alunos, cinco terem problemas alimentares e outros cinco terem problemas do foro psicológico… e estamos a falar de uma psicóloga que aparecia lá de vez em quando”.
Inês destaca a falta de apoio adequado e a necessidade urgente de melhorias no sistema educacional da dança e é esta a mudança que a jovem procura ao ser, atualmente, também ela professora “Agora, a dar aulas, estou a tentar combater o que eu acho que foi mal feito. Não quero que aconteça aquilo que aconteceu comigo”.